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A cada 12 dias um índio se suicida no Estado

abr 10, 2008 | Geral

O kaiowá Justino da Silva, de 22 anos, foi mais uma vítima de suicídio em Mato Grosso do Sul. Às 6 horas de ontem, Celina Gomes encontrou o filho enforcado com uma cinta. O corpo estava dependurado na madeira que atravessa a cobertura da casinha de sapê, na aldeia Taquaperi, em Coronel Sapucaia, a 383 quilômetros da Capital.

Segundo noticiou o Midiamax, neste ano já são oito casos de suicídio indígena. A média é de uma morte a cada 12 dias. As vítimas, jovens índios na faixa etária entre 14 e 35 anos.

No caso registrado em Coronel Sapucaia, após ver o filho morto, a mãe cortou com a faca o couro do cinto e colocou o filho no chão.

Silva morava sozinho na casa. O pai dele, Quirino da Silva, disse aos investigadores de Coronel Sapucaia que o filho tinha ingerido bebido alcoólica na noite anterior. Ele atribuiu à embriaguez a tragédia.

No dia 10 de janeiro foi registrado o primeiro caso de suicídio este ano em Mato Grosso do Sul. E.B.S., 17 anos, foi encontrado enforcado com um cinto numa árvore próxima à sua residência, na aldeia Bororó, na reserva indígena de Dourados. O corpo foi encontrado pelo pai da vítima, Jorge Batista, 39 anos.

Cinco dias depois o corpo de Nilton Rodrigues, de 18 anos, foi encontrado por familiares pendurado a uma laranjeira, no quintal da residência deles em Novo Horizonte do Sul. O indígena usou uma camiseta para cometer o suicídio. Ele era da etnia kaiowá.

Saúde Pública

Dados da Funasa mostram que, em 2007, ocorreram 42 casos de suicídios entre indígenas no Estado. Suicídios são tratados pela Fundação como questão de saúde pública. Apenas na reserva indígena de Dourados, foram 13 casos de suicídio no ano passado (até 22 de dezembro de 2007).

Para o gerente do Projeto Vigisus II, da Funasa (Fundação Nacional de Saúde), Carlos Coloma, há uma coexistência de problemas, “uma série de dificuldades, uma grande perda de território, uma grande restrição de mobilidade da população que é tradicionalmente nômade, uma grande ruptura entre as gerações, com uma consequente quebra de valores, de modos de vida, que em geral significa crise. Além da crise da adolescência, uma crise de valores culturais”.

No dia 13 de março no município de Eldorado, o guarani-kaiowá Valdir Fernandes, de 18 anos, foi encontrado morto. Ele estava enforcado numa corda dependurado sentado perto da porta no barraco de sapê. Embora haja a suspeita de suicídio, o caso foi registrado como homicídio.

Outra vítima do suicídio, João Vasques, de 20 anos, guarani-caiuá, morreu no dia 21 de fevereiro, na aldeia Amambaí, a cerca a cerca de 5 quilômetros da área urbana do município. Segundo informações da polícia, o jovem teria amarrado uma corda em um galho de um árvore, onde se enforcou. Ele foi encontrado pelos familiares.

Limite

Para indigenistas, o choque cultural aliado à falta de perspectivas e o confinamento das populações em pequenas áreas são ingredientes trágicos.

Um dos episódios mais agressivos noticiados pelo Midiamax aconteceu no dia 20 de fevereiro no município de Paranhos, na aldeia Protero Guassu – que em guarani significa lugar bem grande. O guarani Ronei Benites, de 14 anos, e seu pai, o cortador de cana Cecílio Benites, de 35 anos, foram vítimas de suicídio. O crime marcou a cidade de 10,7 mil habitantes.

Sem o consentimento para comprar o material para encapar os cadernos, porque a mãe e o pai não tinha dinheiro, o jovem adolescente tomado pela raiva, pegou a espingarda do pai e atirou contra si. O tiro no abdômen fez a bala atravessar todo seu peito até sair pelo pescoço. O pai, em ato de desespero pegou a espingarda, trocou o cartucho e atirou contra si no pescoço morrendo também ao lado do filho mais velho na pequena casa da aldeia onde moravam com a família de seis crianças – 12, 9, 6, 5, 3 e 1 ano de idade.

Definir o limite do choque cultural e a morte para os índios talvez possa ser expressado pelo o que disse o professor indígena, tio do adolescente. “Ele era bem estudioso, participativo nas aulas. Para ele fazer o que fez devia ter sentido muita tristeza”.

Álcool

Em 12 de fevereiro de 2008, outro jovem guarani comete suicídio seis meses após o irmão dele tirar a vida da mesma forma. Em ambos os casos a embriaguez surge como parte do cenário. A Legislação proíbe a venda de bebidas alcoólicas aos indígenas.

Na Aldeia Bororó, na Reserva Indígena de Dourados, dona da maior concentração guarani de Mato Grosso do Sul, Nilson Romeiro Lopes, de 16 anos foi encontrado enforcado por uma corda dependurado em uma árvore próxima a casa da família.

O irmão de Nilson, Vanilton Romeiro Lopes, 21, se matou em setembro de 2007.

Nebulosidade

No dia 20 de janeiro, a Agência Brasil trouxe a notícia “Suicídio e alcoolismo entre jovens de Mato Grosso do Sul levam indígenas ao debate”. Nela, o gerente do Projeto Vigisus II, da Funasa, Carlos Coloma, considerou nebulosa a causa das mortes violentas entre jovens, a maioria guarani. “Como a cultura indígena é intensamente espiritualizada, para tentar compreender o suicídio entre eles, teríamos que falar sobre a crença nos espíritos e como eles são afetados por essas entidades.”

Coloma disse que o jovem indígena, assim como os de outras comunidades, enfrenta uma série de problemas e necessita de apoio. O desconhecimento e a falta de estatísticas e informações sobre o fenômeno do suicídio não podem ser, de acordo com ele, impedimentos para que agentes públicos, comunidades e famílias atuem para mudar a realidade colocada.

Um exemplo da falta de dados precisos é o trazido pela CPI da Subnutrição em audiência ocorrida no fim de março em Dourados e Campo Grande. Os parlamentares apontaram 39 suicídios no ano passado. A Funasa traz 42 mortes, de acordo com matérias já publicadas.

Sentimentos

“Nós acreditamos que, ainda que continuemos não conhecendo melhor a arquitetura, como se cria esse processo, essa vontade de morrer, de se matar, é preciso apoiar os jovens das comunidades indígenas onde se verifica grande número de mortes”, afirmou conforme noticiou o Midiamax.

É preciso evitar que os jovens indígenas se sintam sozinhos, pois eles necessitam de alguém com quem conversar, falar de seus sentimentos, de seus problemas, de suas preocupações, diz.

“São tão intensos alguns sentimentos, como por exemplo, a vergonha que pode levá-los a se matar diante um vexame público, uma humilhação. Essa reação é pouco comum em outras culturas, mas na indígena é muito significativa”. (Com informações da Agência Brasil)

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