Coordenação dos Movimentos Sociais elabora cartilha com propostas de política econômica para a geração de empregos e para o crescimento econômico sustentado do país. Documento critica vários pontos da política governamental e subsidiará a campanha nacional contra o desemprego, principal bandeira da CMS para 2004.
São Paulo – A Coordenação dos Movimentos Sociais (CMS), rede nacional de movimentos e organizações criada ano passado para unificar atividades e lutas de setores como sindicalistas, trabalhadores rurais, estudantes e mulheres, entre outros, elaborou esta semana uma cartilha que, além de traçar um histórico da política econômica brasileira dos últimos 20 anos, apresenta uma série de medidas que, segundo os movimentos, deveriam ser adotadas pelo governo para que o país volte a crescer de forma sustentada. A cartilha deve embasar os trabalhos de mobilização da Campanha Nacional contra o Desemprego, que começam neste mês de março com a realização de grandes assembléias em todos os Estados brasileiros.
A fórmula apresentada pela CMS para a reversão da crise social do país, que, segundo os movimentos, se traduz principalmente no desemprego e na manutenção das políticas econômicas neoliberais implantadas na década de 90, se contrapõe, em grande parte, às estratégias adotadas pelo governo Lula em seu ano e pouco de gestão. Segundo os movimentos, para começar, a posição do governo nas discussões sobre a Área de Livre Comercio das Américas (Alca) e a Organização Mundial do Comércio (OMC) tende a permitir que o país adote políticas que poderão levar a um agravamento da “concorrência desleal entre os produtos norte-americanos e brasileiros, gerando mais desemprego”, além de aceitar regras supranacionais que “diminuiriam as possibilidades do Estado de atuar na economia em favor dos pobres”.
Para a CMS, a geração de empregos depende de vários fatores – desde o aumento dos gastos públicos em infra-estrutura, educação e saúde, até a diminuição imediata dos juros e o controle de capitais. “É preciso mudar esta política [econômica], controlar a entrada e saída de capitais (principalmente os de curto prazo), limitar as remessas de riquezas para o exterior e também renegociar a dívida externa. A economia traduzida no superávit primário deve ser destinada a investimentos públicos essenciais, principalmente aqueles voltados para a geração de novos postos de trabalho. Em vez de reduzir gastos orçamentários para satisfazer credores, queremos que os impostos do povo sejam usados para gerar empregos no Brasil”, diz a cartilha. Nesse sentido, o documento também afirma a necessidade do fortalecimento do mercado interno e investimento em infra-estrutura (com reforma de estradas e construção de novas, ampliação do saneamento urbano e do sistema elétrico, entre outros).
Outra reivindicação da CMS é, além do aumento real do salário mínimo para incentivar o aquecimento do mercado, a redução da jornada de trabalho sem diminuição dos rendimentos do trabalhador. Segundo o documento, as novas tecnologias levaram a uma menor necessidade de mão-de-obra no setor produtivo. “Nos anos 90, o avanço tecnológico liquidou 10,8 milhões de postos de trabalho. A redução da jornada de trabalho sem redução de salários favorecerá o crescimento da economia e pode gerar 1,7 milhão de novos empregos”. A cartilha termina com uma grande conclamação à mobilização popular e à adesão da sociedade civil às discussões propostas pela CMS, com o objetivo de fortalecer a pressão social sobre o governo.
Na prática
Para o economista da Unicamp Luiz Gonzaga Belluzzo, as propostas da CMS são muito interessantes, mas a sua implementação depende, acima de tudo, de fatores políticos alheios aos aspectos técnicos. Segundo o economista, o PT assumiu o governo sem uma idéia fechada de como conduzir a economia, o que deixou o governo à deriva e vulnerável às pressões do mercado internacional. “Acredito que é preciso uma grande pressão popular para equilibrar as pressões do mercado sobre o governo. Se esta é a proposta da CMS, acho que está no caminho certo.”
Apesar do apoio à iniciativa dos movimentos, Belluzzo acredita que o desafio é grande porque os miseráveis e a classe média ainda não estão preparados para assumir ou participar de um movimento massivo por mudanças. “Os muito pobres são completamente despolitizados, e a classe média é individualista. A política econômica não vai mudar facilmente mesmo sob pressão, porque o governo teria que estar disposto a pagar um alto preço político se resolver confrontar os interesses do mercado internacional. Qualquer mudança aumentaria o Risco Brasil, causaria fuga de capitais, enfim, desestabilizaria a economia como ela está sendo planejada.”
Para Belluzo, a melhor estratégia para implementar uma campanha do porte da proposta pela CMS seria trabalhar as várias demandas de forma progressiva. “Primeiro há que se buscar a recuperação do emprego, depois do salário, depois a redução da jornada de trabalho, e assim sucessivamente. Assim a campanha pelo emprego teria mais chances de ser bem-sucedida.”
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