Grupo paulista defende melhorias na estrutura, enquanto o outro bate na tecla de aumento de verba
Aumentar o investimento ou melhorar a estrutura. São essas as duas principais visões que devem dominar, do ponto de vista da universidade, os debates sobre a reforma do ensino superior, tema que o novo ministro da Educação, Tarso Genro, escolheu como prioridade zero do seu mandato.
Reitores e docentes mais ligados a universidades federais e entidades estudantis defendem a elevação urgente dos gastos do governo. As 54 federais fecharam o ano passado com um rombo orçamentário de mais de R$ 60 milhões.
Algumas mal conseguem pagar contas de água e luz. Investir em pesquisa, nem se fala. No ano passado, o orçamento das instituições foi de R$ 470 milhões.
Mas, para um grupo de intelectuais da Universidade de São Paulo (USP) que se reuniu para discutir a reforma, aumentar simplesmente o volume de recursos para as universidades não é a solução. “Achamos que, se a estrutura da universidade for mantida, um aumento de recursos não vai gerar ganhos qualitativos. Por si só, mais dinheiro não trará melhorias”, diz o professor do Departamento de Sociologia Ricardo Musse, um dos coordenadores do Fórum de Políticas Públicas da USP. O grupo preparou um documento assinado pelos professores Marilena Chauí e Sérgio Cardoso, cuja versão preliminar já foi entregue a Genro.
O ministro tem também em mãos outros três documentos sobre o tema, preparados pela Associação dos Dirigentes de Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), pela Associação Nacional dos Docentes do Ensino Superior (Andes) e pela União Nacional dos Estudantes (UNE). Cada entidade defende suas prioridades na reforma. Mas todas coincidem num ponto: as universidades precisam urgentemente de maior financiamento público.
“Com certeza a discussão começa com o aumento de recursos e o que está previsto no Orçamento e no Plano Plurianual de 2004 a 2007 não é suficiente”, diz o vice-presidente da Andes, José Domingues de Godoi Filho.
“O telhado está caindo. Precisamos reformar laboratórios, ampliar bibliotecas, abrir concursos. As universidades podem fazer isso, sem mudar a estrutura”, diz, rebatendo o argumento do grupo da USP.
A presidente da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais do Ensino Superior (Andifes), Wrana Panizzi, também defende o aumento de investimento em educação pública. “Praticamente todas as federais terminaram o ano com alguma dívida. Precisaríamos de mais R$ 66 milhões para pagar as contas”, disse. “As contas de água, luz, telefone aumentaram cerca de 30%, além de serviços de segurança e limpeza que também foram reajustados.”
O presidente da UNE, Gustavo Petta, vai no mesmo tom. “Para sintonizar a universidade com um projeto de desenvolvimento nacional é preciso aumentar o financiamento.”
Indagado se o MEC terá como atender à demanda por mais verba durante a reforma, Genro já disse que não quer “precipitar essa discussão”. Mas afirmou esperar que até julho alguns consensos estejam formados para a redação de um projeto de lei. Antes mesmo de assumir, anunciou que vai criar uma espécie de assembléia constituinte com representantes de todos os setores ligados ao ensino superior para debater o tema.
Na pauta da reforma, reitores, professores e estudantes também querem tratar da autonomia administrativa (as federais, por exemplo, levam até três meses para obter autorização e contratar professores em caráter emergencial), de gestão democrática (com a participação de alunos, funcionários e docentes na escolha de reitores e conselhos) e ampliação do acesso. O grupo da USP incluiu esses e outros pontos em seu documento. Mas se pergunta se, sem uma mudança estrutural, um novo aporte de recursos daria conta de atender a todas essas demandas.
(Marcos de Moura e Souza)
Publicado em 29.01.2004
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